Enviado por João Emidio
Povo.
É para mim pegar. O carro deu perca total. Menas gente. Estes e tantos outros erros são ouvidos diariamente entre nós brasileiros. Uma exposição no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, trata disso. Tema: "Menas: o certo do errado, o errado do certo", que enfoca os erros presentes na nossa fala e escrita. O "pobrema" já começa na premissa que conceituou a mostra. Afirma um dos idealizadores: "Não estamos querendo condenar essas expressões ou dizer ao público o que é certo e o que é errado". "O mais importante é provocar a discussão, a polêmica e a reflexão."
Agora tudo ficou relativo. Há um cuidado politicamente correto em ficar em cima do muro. Já basta à prática intelectual promover o debate e não questionar a fundo nossa histórica deficiência educacional. Alega-se: "Errar é humano. O importante é se entender." Como a ignorância da língua é demonstrada até mesmo pelo Presidente da República, fica subentendido que é melhor fazer vista grossa e aceitar tal deficiência como mais um traço de brasilidade.
A fala coloquial e a gíria têm modos peculiares de tratar a língua. Natural e aceitável dizer "eu vi ele" e "me passe o sal" porque são exemplos de comunicação informal cotidiana. Outra coisa bem diferente é achar bonito falar dez real, como defende a curadoria da mostra. Erros de linguagem devem ser corrigidos. Preferiu-se fechar os olhos e misturar a incorreção aceitável com o erro imperdoável. Não pode haver o certo do errado, nem tampouco o errado do certo. Erro será sempre erro. E as vítimas são 12 milhões de brasileiros analfabetos adultos e um número muito maior ainda de analfabetos funcionais que mal sabem escrever e entender o que leem.
Nóis fumo, nóis vortemo, nóis num vai mais. Adoniran Barbosa foi menosprezado por suas músicas trazerem erros de português como esses. Era visto como um compositor exótico, pitoresco, sem maior importância. Até que um dia o emérito e prestigiado professor da USP, Antonio Cândido, reconheceu o verdadeiro valor de sua obra. Deixou claro que as letras de Adoniran evidenciavam recursos linguísticos de uma rica mistura do dialeto caipira com dialetos dos imigrantes europeus. Por exemplo, quem ainda hoje fala despois expressa a forma como a palavra era falada corretamente no século 17.
A língua é viva por receber contribuições. É um recurso legítimo de cada povo enriquecer sua língua e um direito de todo artista se servir desse acervo popular. Comprove isso ouvindo "As Mariposas", com os Demônios da Garoa. Quando chega o frio, as mariposas ficam dando vorta em vorta da lâmpida, "elas roda, roda, roda, despois se senta em cima do prato da lâmpida pra descansar". Somente Adoniran iria tão longe no diálogo sedutor entre a 'lâmpida' e a mariposa para permanecer tão fiel, perto e dentro de nossa cultura.
Que seje sempre anssim. É nóis. | ||
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