Será mesmo possível conciliar produção e preservação ambiental?
Por Maristela Crispim*, do Diário do Nordeste
O fato de as águas abrirem novos caminhos na região serrana do Rio de Janeiro, durante as chuvas deste verão, mudando a geografia local e muitas vidas para sempre, bem que poderia estimular uma mudança efetiva de postura. Afinal, é apenas mais um sinal de que não podemos brincar com o equilíbrio natural do Planeta sem arcar com as consequências.
Ironicamente, o Brasil chega ao Ano Internacional das Florestas - declarado pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) para sensibilizar a sociedade sobre a importância da preservação das florestas para uma vida sustentável no Planeta, com o tema “Florestas para o Povo” - em meio a uma discussão preocupante.
Desde o ano passado estabeleceu-se, no âmbito da Câmara dos Deputados, um debate que pôs de um lado ruralistas e de outro ambientalistas, sobre a reforma do Código Florestal Brasileiro (Lei Federal Nº 4.771), criado no governo de Getúlio Vargas, em 1934.
As normas nele contidas partem do pressuposto de que a conservação dos recursos naturais interessa a toda a sociedade, por garantir serviços naturais básicos - como a regulação do ciclo das águas (incluindo abastecimento e evitando desastres) e proteção da biodiversidade (garantindo o controle de pragas) - que sustentam a vida e apoiam a economia. Basicamente, o Código Florestal obriga a preservação de áreas sensíveis, as Áreas e Preservação Permanentes (APPs), e a manutenção de uma parcela de vegetação nativa nas propriedades rurais, as Reservas Legais (RLs).
A natureza do nosso País tem sido vista desde sempre como fonte de recursos inesgotável e, as florestas, como “obstáculos” a impedir o avanço do desenvolvimento, visão que permanece forte em alguns rincões do Brasil, onde a queimada ainda é vista como melhor opção para “limpar” a terra. Como, então, garantir a produção de alimentos, a manutenção do lucro dos produtores e o crescimento econômico sem comprometer os recursos naturais para as atuais e futuras gerações?
A proposta mais sensata, me parece, é deixar essa antagonismo produção / conservação, agricultura / biodiversidade, natureza / sociedade e adotar, para o setor agropecuário, uma abordagem que inclua investimentos no aumento da produtividade em áreas já consolidadas, na diversificação da produção, no fortalecimento da agricultura familiar, na promoção de sistemas agroflorestais e também no pagamento por serviços ambientais.Outra coisa: o Código Florestal é urbano e rural na medida em que núcleos urbanos e propriedades rurais avançam sobre florestas, rios, riachos, nascentes, encostas e outras áreas que não podem ser desmatadas.
É óbvio que não dá para pender totalmente para nenhum dos dois lados, mas, assim como o nosso sábio Planeta, aprender a atingir um equilíbrio de forças que não comprometa a sustentação de ambos, pois é inquestionável a dependência dos recursos naturais para o próprio desenvolvimento agropecuário.É necessária uma discussão sobre o Código Florestal que considere a gestão integrada de território, recursos hídricos e proteção de solos, fundamentada cientificamente. Se essa legislação não existisse, apesar do frequente descumprimento de seus dispositivos, nem mesmo haveria objeto de discussão, pois nossos recursos já estariam irremediavelmente dizimados.
Proposta do Executivo
A proposta do deputado federal Aldo Rebelo (PCdoB-SP) - que prevê redução das áreas de RL e APP, anistia a quem desmatou ilegalmente e o fim da obrigação de recuperar passivos ambientais - foi aprovada por uma comissão especial e deve ser votada pelo plenário da Câmara Federal agora em março.
A presidente Dilma Rousseff, que se comprometeu na campanha a não anistiar desmatamentos, encarregou a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, de costurar um consenso entre lideranças ruralistas e ambientalistas. O governo prepara, assim, proposta que prevê o plantio em APPs para a agricultura familiar e exclui anistia a desmatadores.O coordenador da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Moacir Micheletto (PMDB-PR), já declarou que os parlamentares não vão aceitar um texto pronto do Executivo e que a proposta que valerá para o debate na Câmara é a de Aldo Rebelo. Segundo ele, as bancadas estão tentando negociar os pontos mais polêmicos, inclusive com o MMA, para viabilizar as mudanças da lei ainda no primeiro semestre.
Lideranças ruralistas mantém a movimentação para apressar a votação, para evitar as restrições de financiamento rural, já que, a partir de 12 de junho, o Banco do Brasil não vai mais emprestar dinheiro para produtores que não cumprirem o código ou aderirem ao programa de regularização do governo, o Mais Ambiente.
*Editora de Reportagem.
Crédito: Cid Barbosa(Envolverde)
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