Infelizmente no Brasil todos os debates são superficiais. Haja vista a lixeira que transita diariamente na internet (um bando de ignorantes com opinião formada sobre tudo).
Nos governos ou nas empresas não podemos fazer uma análise primária do fluxo de caixa (entradas menos saídas), mas sim um fluxo de caixa técnico demonstrando qual a geração bruta de caixa: a geração operacional de caixa e a geração líquida de caixa.
Da mesma forma não podemos debater o tema previdência, sem fazer a distinção entre Resultado Previdenciário (deficitário) e Resultado Operacional (superavitário), bem como entre trabalhadores de primeira classe (públicos) e trabalhadores de segunda classe (privados). Caso contrário vira um debate entre bêbados.
Seu artigo comentando o debate do Bom Dia Brasil com a Dilma prova que a imprensa brasileira é o segmento onde se concentra o maior número de estúpidos por metro quadrado, visto que bastava uma pequena preparação dos jornalistas estudando o site oficial do governo brasileiro, abaixo mencionado, para contestar a colocação do “poste” que estava sendo entrevistado.
Nota: Todas as informações sobre o tema estão disponíveis no Anuário Estatístico da Previdência Social – AEPS.
Previdência Social no Brasil
Ricardo Bergamini
Nos meus 40 anos dedicados ao estudo das ”Contas Nacionais” posso afirmar ser esse o tema mais confuso de todos, visto sua alta complexidade e pelas distorções acumuladas ao longo de sua existência, além de que, por deformação cultural de nossa sociedade, todos os temas no Brasil são abordados superficialmente na análise quantitativa dos problemas nacionais, sem nenhuma profundidade na análise qualitativa dos problemas nacionais.
No caso da previdência os debates e os estudos existentes se restringem a tentar provar, o óbvio e o ululante, ou seja: a não existência de déficit na previdência. Realmente déficit é apenas uma informação gerencial, não existente, na realidade, em nenhuma parte do planeta, já que todos os déficits existentes foram cobertos, inexoravelmente, com uma das seguintes medidas: aumento de carga tributária; redução de poupança; aumento de dívida, ou no caso dos governos centrais com emissão de moeda.
Em 2008 o Resultado Previdenciário (Receitas Previdenciárias – Despesas Previdenciárias) foi deficitário em R$ 112,3 bilhões (União, Estados e Municípios), que é totalmente diferente do Resultado Operacional superavitário em R$ 1,2 bilhão, onde, por exemplo, são incluídas nas receitas as transferências da União (COFINS, CSSL, CPMF), além dos rendimentos das aplicações financeiras. Nas despesas, por exemplo, são incluídos pagamentos ao sistema “S” (SENAI, SENAR SESC, SESI), além do pagamento aos 3,0 milhões de beneficiários assistenciais sem contribuições.
Resultado Previdenciário
É o resultado apurado (contribuições e benefícios) apenas entre os membros do grupo de previdência, ou seja: empregadores, empregados formais com carteira de trabalho assinada e trabalhadores autônomos formais, que no ano de 2008 gerou um déficit (União, Estados e Municípios) da ordem de R$ 112,3 bilhões.
Devido a distorções e privilégios concedidos durante longo tempo o sistema não consegue se equilibrar por conta própria, assim sendo são criadas novas fontes de financiamentos para atingir o equilíbrio, gerando o Resultado Operacional superavitário de R$ 1,2 bilhão.
Resultado Operacional
Somente os ignorantes, com opinião formada sobre tudo, podem defender uma excrescência econômica e desumana desta magnitude, e ainda se colocarem como sendo socialistas.
Além do acima colocado não podemos abordar o tema Previdência no Brasil sem fazer a distinção entre trabalhadores de primeira classe (setor público) e trabalhadores de segunda classe (setor privado).
Em 2008 a receita previdenciária dos 1.147.840 servidores ativos do governo federal, parte patronal e desconto dos inativos foi de R$ 8,2 bilhões. A despesa previdenciária dos 1.060.881 servidores inativos e pensionistas, com salário médio mensal de R$ 4.964,43, foi de R$ 63,2 bilhões, fazendo com que o resultado previdenciário fosse negativo em R$ 55,0 bilhões (1,83% do PIB).
Em 2008 a receita previdenciária dos 2.724.556 servidores ativos dos governos estaduais, parte patronal e desconto dos inativos foi de R$ 26,1 bilhões. A despesa previdenciária dos 1.634.409 servidores inativos e pensionistas, com salário médio mensal de R$ 2.641,11, foi de R$ 51,8 bilhões, fazendo com que o resultado previdenciário fosse negativo em R$ 25,7 bilhões (0,85% do PIB).
Em 2008 a receita previdenciária dos 2.250.258 servidores ativos dos governos municipais, parte patronal e desconto dos inativos foi de R$ 13,2 bilhões. A despesa previdenciária dos 558.521 servidores inativos e pensionistas, com salário médio mensal de R$ 1.700,92, foi de R$ 11,4 bilhões, fazendo com que o resultado previdenciário fosse positivo em R$ 1,8 bilhão (0,06% do PIB).
Em 2008 a receita previdenciária pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) foi de R$ 162,0 bilhões em contribuições de empresas e parte patronal de algumas prefeituras (11,9 milhões de contribuintes) e de empregados e autônomos ativos da iniciativa privada e de empregados de algumas prefeituras (53,7 milhões de contribuintes). A despesa previdenciária dos 22,4 milhões de aposentados e pensionistas, com salário médio de R$ 715,30, foi de R$ 195,4 bilhões, fazendo com que o resultado previdenciário fosse negativo em R$ 33,4 bilhões (1,11% do PIB).
O autor é professor de economia.